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ACÓRDÃO N.º 1009/2025
PROCESSO N.º 1224-D/2024
Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade
Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I.  RELATÓRIO
ANGOIMO – Empreendimentos e Construções, Lda., melhor identificada nos autos, por não se conformar com a Decisão vertida no Acórdão da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo, que negou provimento ao recurso de apelação, no âmbito do Processo n.º 2415/17, veio ao abrigo do disposto na alínea m) do artigo 16.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho, Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC) e da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade.
Admitido o recurso e notificada a Recorrente, para o efeito, veio em conclusão alegar o seguinte:
1. O Acórdão recorrido violou os princípios constitucionalmente consagrados da legalidade e do julgamento justo e conforme à lei.
2. O princípio da legalidade, plasmado no n.º 2 do artigo 6.º da CRA, constitui uma das traves-mestras do Estado Democrático de Direito (n.º 1 do artigo 2.º da CRA), pois estabelece que nenhum acto pode ser contrário à lei, devendo, portanto, todos os actos estarem conforme a lei, ex vi dos artigos 2.º e 6.º, ambos da CRA.
3. No âmbito da legalidade da função jurisdicional, os Tribunais necessitam de um fundamento constitucional e legal das suas decisões, porém, na Decisão recorrida chegamos à conclusão de que houve uma flagrante violação do princípio da legalidade, reflectido na ausência de qualquer exame crítico às provas apresentadas e existentes nos autos.
4. A actuação dos Juízes do Tribunal Supremo, no Acórdão recorrido, viola o princípio do julgamento justo e conforme a lei, porquanto, o Tribunal Supremo fundou a sua convicção de saber se, estão ou não reunidos os pressupostos da responsabilidade civil, com base na inexistência do nexo de causalidade entre o facto invocado pela Recorrente e o dano, por esta, alegadamente, não ter suficientemente demonstrado nos autos prova da situação do imóvel anterior ao arrendamento, o que não corresponde à verdade.
5. A verdade é que resulta da cláusula sexta do contrato de arrendamento assinado pelas partes, Doc. n.º 2, que, o locador entregará e o locatário receberá o imóvel objecto de arrendamento em bom estado de conservação e funcionamento, e este o devolverá igualmente em bom estado de conservação e funcionamento.
6. Ora, se existe um contrato considerado pelo Tribunal Supremo como válido e eficaz, e nele existe, uma cláusula que de forma expressa diz que o locador entregará o imóvel objecto de arrendamento em bom estado de conservação, e o locatário recebeu o imóvel, sem questionar e sem apresentar reservas, assinou o contrato, outro entendimento não se pode retirar a não ser o de que, o imóvel estava na data de ocupação pelo arrendatário em bom Estado de conservação, ou seja, há nos autos prova bastante do bom estado inicial do imóvel, ou, pelo menos, presunção (ainda que relativa) de que, as instalações estavam em bom estado de conservação no momento em que foram entregues ao locatário.
7. Portanto, caso este não seja o entendimento, estaríamos diante de um venire contra factum proprium da parte do Banco Espírito Santo Angola, ao assinar um contrato com o conteúdo da sexta cláusula se, as instalações não estivessem prontas a ocupar, e sem, entretanto, fazer qualquer reserva. 
8. Assim sendo, o contrato que deveria servir de critério hermenêutico para a Decisão do Tribunal Supremo, e não outras razões desconhecidas pela Recorrente.
9. Embora o Tribunal decida segundo a sua consciência, deve objectivar a sua subjectividade, isto é, deve encontrar nos factos e nos documentos que os suportam, o fundamento objectivo para a sua decisão, não devendo infundadamente ignorar as provas constantes do processo.
10. Relativamente à questão da nulidade do contrato por falta de forma, andou muito bem o Tribunal Supremo ao considerar que, "a falta da celebração da escritura pública, por força do artigo 293.º do Código Civil, não invalida, in totum, o contrato de arrendamento em causa".
11. Ora, diante desta conclusão, à margem do dever de decisão, contrariando a expectativa da Requerente em confiar nos Tribunais e o seu direito a um julgamento justo e conforme à lei, o Tribunal Supremo, no Acórdão de que ora se recorre, não retira qualquer consequência jurídica dessa sua conclusão, limitando-se a lembrar que “só o locatário tinha legitimidade para invocar a nulidade do contrato de arrendamento, quando, na verdade, foi exactamente isso que sucedeu”.
12. Nestes termos, ao ter considerado que o Contrato de Arrendamento se converteu em Contrato Promessa de Arrendamento deveria condenar a Requerente nos pedidos formulados, pois;
13. O facto de o locador não poder invocar, in casu, a nulidade do contrato (e não foi este quem invocou) não anula a solução jurídica apresentada no artigo 293.º do Código Civil, a que o juiz está vinculado a observar.
14. Para fundamentar a inexistência do direito à indemnização da Recorrente em sede de responsabilidade civil, o Tribunal Supremo conclui que "não há no caso direito de indemnização".
15. Não valerá, naturalmente, o argumento de que não há direito à indemnização por falta de pressupostos da responsabilidade civil, pois, como referido, estes pressupostos estão todos preenchidos e demonstrados no processo, cabendo ao Juiz demonstrar porque entende que não se encontram preenchidos. E, diante disso, os Juízes Conselheiros do Tribunal Supremo apenas teriam a responsabilidade legal de os consultar para sustentar a sua Decisão e não simplesmente afirmar que nada resulta dos autos que evidencie que no acto da celebração do contrato de arrendamento, o imóvel, as instalações em causa estavam em condições diferentes das que hoje são apresentadas pela Apelante".
16. O direito ao julgamento justo é, ainda, violado quando os Juízes Conselheiros do Tribunal Supremo, sem fazer qualquer análise crítica da prova apresentada pela Recorrente, concluem que, da factualidade provada, não se vislumbra enriquecimento sem causa nos autos porque não ficou demonstrado, por parte da Autora, o estado do imóvel em causa antes da celebração do contrato de arrendamento, o que realmente dificulta aferir se há existência de um enriquecimento.
17. O Tribunal Supremo, no seu Acórdão, não analisou com justiça, objectividade e imparcialidade a questão materialmente controvertida, bem como as provas que foram juntas ao processo, retirando, deste modo, a justiça devida ao caso concreto.
18. Nestes termos, inexistem dúvidas de que o Acórdão objecto do presente recurso, ao posicionar-se nos termos acima referidos, contraria o sentido constitucionalmente pretendido do julgamento justo e conforme à lei, representando, por isso, um limite ao acesso à justiça.
19. Em consequência, considera que o Acórdão recorrido violou o princípio do julgamento justo e conforme à lei, considerando-se todos os fundamentos acima referidos, que se dão por integralmente reproduzidos neste ponto.
Termina as suas alegações requerendo que o Tribunal Constitucional dê provimento ao presente recurso, por violação do princípio da legalidade e do direito a julgamento justo e conforme.
O processo foi à vista do Ministério Público. 
Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.
II.  COMPETÊNCIA 
O Tribunal Constitucional é competente para conhecer e decidir o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, nos termos da alínea a) e do parágrafo único do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), bem como das disposições conjugadas da alínea m) do artigo 16.º e do n.º 4 do artigo 21.º, da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho, Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC).
III.  LEGITIMIDADE
A Recorrente é parte legítima no Processo n.º 2415/17, que correu trâmites na Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo. Tem direito a contradizer, segundo dispõe o n.º 1 do artigo 26.º do CPC, aplicado subsidiariamente ao processo constitucional, ex vi do artigo 2.º da LPC.
A legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, cabe-lhe, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da LPC.
IV.  OBJECTO 
O objecto do presente recurso consiste em aferir se, o Acórdão do Tribunal Supremo, datado de 07 de Abril de 2022, proferido no âmbito do Processo n.º 2415/17, terá de facto violado direitos fundamentais da Recorrente, concretamente, o direito a julgamento justo e conforme e o princípio da legalidade.
V.  APRECIANDO
O presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, resulta da inconformação da Recorrente em relação ao Acórdão proferido pela Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 2415/17, que julgou parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por esta, tendo declarado nula a decisão do Tribunal a quo, sem que, entretanto, tivesse atendido ao pedido de indemnização por si requerido. 
Razão pela qual entende a Recorrente que, com a referida decisão, ter sido posto em causa o direito a julgamento justo e conforme, bem como o princípio da legalidade, consagrados na Constituição da República de Angola (CRA). 
Veja-se; 
A responsabilidade civil apresenta-se hodiernamente como uma das formas mais comuns de reparação do dano causado a outrem. É, ainda, a forma mais e melhor estruturada no âmbito da protecção dos direitos das pessoas. 
Como assevera Carlos Burity da Silva, “a responsabilidade civil é indubitavelmente, um dos temas mais palpitantes e problemáticos da actualidade jurídica, ante a sua surpreendente expansão no direito moderno”. E mais diz “A responsabilidade civil consiste na necessidade imposta pela lei a quem causa prejuízos a outrem de colocar o ofendido na situação em que estaria sem a lesão. Visa tornar indemne, sem dano, o lesado, visa colocar a vítima na situação em que estaria sem a ocorrência do facto danoso (artigos 483.º e 562.º do Cód. Civil)” (Teoria Geral do Direito Civil, 2.ª ed. revista e actualizada  - 2ª Reimpressão, pp. 175 e 176).
Ora; 
A responsabilidade civil, constitui-se, também, num meio essencial para efectivação e amparo dos direitos e garantias previstos na Constituição da República de Angola, isto é, na forma de concretização e reparação de danos individuais, patrimoniais e não patrimoniais, cujos pressupostos encontram-se descritos no artigo 483.º do Código Civil.
Assim, nos termos da referida norma, “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
A jurisprudência firmada por este Tribunal Constitucional tem entendido que a responsabilidade civil pressupõe a existência e verificação de um facto, ilícito, culposo, danoso e um nexo de causalidade entre o facto e o dano, vide Acórdãos n.ºs 840/2023 e 738/2020.
O Tribunal ad quem, na Decisão posta em crise, entende que os pressupostos para a responsabilização civil a favor da Recorrente não se encontram preenchidos, pois, dos elementos de prova carreados aos autos pelas partes, bem como  as produzidas em sede da audiência própria, levaram-no a concluir pela inexistência de um nexo de causalidade entre os danos causados e a conduta da Ré-Apelada naqueles autos, porquanto, não ter ficado devidamente demonstrado, nos autos, como era o imóvel, e em que estado se encontrava até antes da celebração do alegado contrato de arrendamento.
 
Da Decisão, se infere, ainda, que a Recorrente não fez prova do estado em que se encontrava o imóvel, até antes da celebração do contrato de arrendamento estabelecido com a Ré-Apelada. 
Contudo, contrariamente ao decidido, entende a Recorrente que existe nos autos, prova suficiente que demonstra que o imóvel no acto de entrega à Ré- Apelada estava em bom estado, como resulta do contrato de arrendamento, mais precisamente referência descrita na cláusula sexta “o locador atesta e garante à locatária que as instalações serão entregues em bom estado de conservação e funcionamento, não apresentando defeitos que possam impedir a sua plena utilização pela locatária” “as instalações, os utensílios e equipamentos serão devidamente conservados pela locatária e no final do arrendamento deverão ser restituídos à Locadora em bom estado  de conservação, manutenção e limpeza, bem como sem deteriorações, salvo as inerentes a uma prudente utilização em conformidade com os fins do contrato”.
Sendo, pois, a questão controvertida a que acima ficou descrita, o quid a analisar e decidir será o de saber, em que medida pode este Tribunal adentrar para a constitucionalidade da aplicação do princípio da livre apreciação da prova pelo Juiz e confrontá-lo com os seus limites, tendo em atenção o princípio da legalidade e do direito ao julgamento justo e conforme invocados pela Recorrente, como tendo sido violados pelo Tribunal ad quem.
De facto, o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador  também comporta limites intrínsecos(obediência à lógica e às máximas da experiência comum, a verdade material, entre outros) e ou extrínsecos (provas ilícitas, provas tarifadas, não obediência às regras de produção de prova) de forma a garantir a realização de um julgamento justo e conforme a lei, a tutela jurisdicional efectiva e em consequência o dever de fundamentação, assegurando-se, deste modo, uma decisão justa, não arbitrária e baseada na verdade material.
Para efeitos processuais, a prova deve definir-se de acordo com a função que desempenha no processo. Esta função visa essencialmente convencer o juiz da veracidade das afirmações feitas pelas partes. 
Segundo Rui Manuel de Freitas Rangel, “pode definir-se a prova, no domínio processual, como a actividade ou o conjunto de operações destinadas à formação da convicção do juiz, sobre a veracidade dos factos controvertidos que foram carreados para o processo pelas partes e que se encontram seleccionados na base instrutória. Ela visa fornecer todos os elementos ao julgador sobre a realidade dos factos controvertidos, sanando, na medida do possível, as dúvidas existentes na sua mente sobre os factos carecidos de prova” (O Ónus da Prova No Processo Civil, Ed. Almedina, 3.ª Edição, 2006, p. 22). 
No mesmo sentido, entende Alberto dos Reis ao referir que a prova é “o conjunto de operações ou actos destinados a formar a convicção do juiz sobre a verdade das afirmações feitas pelas partes” (Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, p. 23). 
Aqui chegados, importa então saber em que medida teria a Decisão do Tribunal ad quem violado os princípios invocados pela Recorrente?
A Decisão do Tribunal ad quem concluiu pela nulidade do Aresto do Tribunal a quo e nos termos do artigo 715º do CPC, fez o aproveitamento para conhecimento do objecto do recurso.
Ora, entende o Tribunal ad quem que a prova apresentada pela Recorrente não é no todo a mais evidente, susceptível ou capaz de fazer emergir os pressupostos para a responsabilidade civil da Ré-Apelada, sustentado que a Recorrente devesse apresentar para o efeito mais elementos probatórios.
A Recorrente, entretanto,  entende que – sendo o contrato o único meio de prova, (prova documental nos termos do artigo 376.º do C. Civil) e que faz fé entre as partes, no qual se fixaram os elementos estruturantes que norteou o negócio jurídico – a valoração do estado do imóvel deveria ser aferida  pelo único meio probatório, o contrato, do qual se extrai que o imóvel foi entregue e aceite pela  Apelante, como estando em bom estado de conservação para qualquer dos fins pretendidos pela Apelada (vide fls. 91 a 96 dos autos),  contrariamente ao referido pela Ré-Apelante, já em fase de denúncia do contrato, de que ”  as referidas instalações foram entregues ao BESA numa situação de se efectuarem as obras segundo os projectos do Banco, vide fls. 131 e 177 dos autos, sem contudo ter  ficado consignado no acordo firmado entre as partes. 
Entende, este Tribunal, que a ponderação seguida na Decisão do Tribunal ad quem, segundo a qual “nada resulta dos autos que evidencie que no acto da celebração do contrato de arrendamento o imóvel, as instalações em causa estavam em condições diferentes das que hoje são apresentadas pela A/Apelante. Desta feita, achamos que só o antes e o depois do uso do referido imóvel poderia evidenciar o alegado pela Autora/apelante, o que não ocorre nos presentes autos” fere os razoáveis limites do princípio da livre apreciação da prova. Aliás, o senso comum e a lógica não nos permitem sufragar a fundamentação do decidendo que, se contrapõe ao princípio do julgamento justo e conforme à lei.
Outrossim, entende este Tribunal que sendo a culpa do lesante um elemento constitutivo do direito à indemnização, e tendo o lesado, como credor, feito prova dela, através de um relatório de avaliação do estado do imóvel findo o contrato de arrendamento( fls. 139 a 163), e não havendo mais outros elementos e, como acima se refere, nos termos gerais da repartição legal do ónus probatório, previsto no artigo 342.º do Código Civil,  estão verificados os pressupostos da responsabilidade civil, isto é, a demonstração do nexo de causalidade entre o dano e a conduta do agente.
Aliás, dos autos, também se pode extrair a possibilidade da responsabilidade civil contratual, que como refere Rui Rangel, nesta “(…) incumbe ao devedor provar que o não cumprimento ou cumprimento defeituoso não procede de culpa sua” (obra citada, p. 174). 
Pelo que, ao exigir-se única e exclusivamente da Recorrente, a demonstração de que o imóvel não estava nas condições acordadas pelas partes, por altura da celebração do contrato e não se exigir da contraente, Apelada,  quando podia fazê-lo (inversão do ónus da prova) é, no mínimo, extravasar os limites do princípio da livre apreciação da prova que, se consubstanciam no julgamento justo e conforme e na tutela jurisdicional efectiva, que impõe ao juiz uma actuação imparcial, no devido processo legal, no dever de garantir a verdade material, entre outros.
A propósito, tem sido este, o entendimento desta Corte Constitucional, ao asseverar que, “as decisões judiciais não podem impor-se apenas em razão da autoridade de quem as profere, mas antes pela razão que as sustenta. A garantia de fundamentação é indispensável para que se assegure o respeito pelo princípio da legalidade da decisão judicial, na medida em que o dever de o Juiz respeitar e aplicar correctamente a lei seria afectado se não pudesse ser sindicado ou se, por alguma forma, essa sindicância fosse afectada.” 
E mais ainda refere o Acórdão que “a sua observância concorre ainda para a garantia da imparcialidade da decisão, porquanto, o juiz só é independente e imparcial se a decisão for fundamentada num apuramento objectivo dos factos da causa e numa interpretação imparcial da norma de direito. A fundamentação adequada e suficiente tem assim uma dupla finalidade, designadamente, como condição de legitimação externa da decisão pela possibilidade que permite de verificação dos pressupostos, critérios, juízos de racionalidade e de valor e motivos que determinam a decisão e a possibilidade de reapreciação através de recursos, para que o tribunal superior possa conhecer do processo de convicção do julgador e o juízo lógico que determinou a decisão” (vide Acórdão 668/2021, de 03 de Março, disponível em www.tribunalconstitucional.ao).
Aqui chegados, importa referir que;
O direito a julgamento justo e conforme, previsto no artigo 72.º da Constituição, está vocacionado para assegurar de forma ampla o cumprimento de todas as garantias processuais na relação entre o indivíduo e o tribunal. Este princípio-garantístico é peculiar aos processos judiciais para que se efective a equidade, a imparcialidade e a obtenção de decisões judiciais em prazo razoável.
Na Constituição angolana este jus fundamental busca, essencialmente, que as partes em isonomia intervenham pleiteando, exercendo os seus direitos de defesa, sob condições plenas de modo a que não sejam prejudicadas, nem tampouco restringidas ou mitigadas as suas garantias, o que não se verificou nos presentes autos em relação à Recorrente conforme acima se referiu.
Nesta conformidade, entende o Tribunal Constitucional que o Acórdão posto em crise alicerçou a sua Decisão numa factualidade não demonstrada legalmente, porquanto, embora reconheça que entre as partes existiu um “contrato” seja na forma de contrato promessa, deixou o Tribunal ad quem de reavaliar as questões fundantes requeridas pela Apelante naqueles autos, em flagrante violação do direito ao julgamento justo e conforme, que é corolário do princípio da legalidade.  Pelo que, em face dos argumentos invocados pela Recorrente e da análise da Decisão recorrida fica demonstrado que foi violado o direito a julgamento justo e conforme e ofendido o princípio da legalidade. 
Nestes termos,
DECIDINDO
Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes do Tribunal Constitucional, em: 
a) DAR PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, POR ENTENDER QUE O ACÓRDÃO RECORRIDO VIOLOU OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA LEGALIDADE E DO JULGAMENTO JUSTO E CONFORME, PREVISTOS NO N.º 2 DO ARTIGO 6.º E NO ARTIGO 72.º, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE ANGOLA;
b) DETERMINAR, NOS TERMOS DO N.º 2 ARTIGO 47.º DA LPC, A BAIXA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DA CAUSA. 
Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional.
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, 1 de Julho de 2025.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso (Presidente) 
Victória Manuel da Silva Izata (Vice-Presidente) 
Carlos Alberto B. Burity da Silva
Carlos Manuel dos Santos Teixeira
Emiliana Margareth Morais Nangacovie Quessongo 
Gilberto de Faria Magalhães (Relator) 
João Carlos António Paulino
Lucas Manuel João Quilundo
Maria de Fátima de Lima D`A. B. da Silva