Loading…
TC > Jurisprudência > Acórdãos > Acórdão Nº 971/2025

 

 

 

 

 

ACÓRDÃO N.º 971/2025

 

PROCESSO N.º 1072-D/2023
Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

 

I. RELATÓRIO

Duarte Augusto Teixeira de Carvalho, Alberto Lemos e José Paulo Casimiro, melhor identificados nos autos, vieram ao Tribunal Constitucional impetrar recurso extraordinário de inconstitucionalidade no Processo n.º 613/17, que correu trâmites na Câmara do Trabalho do Tribunal Supremo, datado 12 de Maio de 2022, que julgou improcedente o recurso mantendo a decisão recorrida.
Admitido o recurso e notificados para apresentar alegações em observância do disposto no artigo 45.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), fizeram-no tempestivamente, conforme se vê a fls. 233 a 239 dos autos. Alegam, em síntese, que:

1. Entendem os Recorrentes que o Acórdão recorrido, proferido pela Câmara do Trabalho do Tribunal Supremo, ofende gravemente os princípios fundamentais com dignidade constitucional.

2. O Tribunal Supremo deixou de apreciar a situação jurídica laboral dos trabalhadores, ora Recorrentes. Saber se houve extinção da relação jurídica laboral e quais os instrumentos que a sustentaram.

3. A questão em torno da justa indemnização dos trabalhadores ora Recorrentes, o Tribunal ad quem deixou de apreciar a inscrição dos Recorrentes na Segurança Social, no que concerne ao direito fundamental de protecção social de sobrevivência.

4. A reivindicação dos trabalhadores de serem inseridos no fundo de pensões da ENSA. Igualmente houve violação do direito probatório, pelo Tribunal a quo, ao declarar como assentes os factos sobre os quais não tinha elementos probatórios suficientes.

Terminam pedindo inteiro provimento ao presente recurso, e, por via dele, que se revogue o Acórdão recorrido por estar em desacordo com a Constituição, designadamente, por violação dos princípios da dignidade humana do trabalhador, da justa indemnização, do valor social do trabalho, da reforma e do respeito pelos direitos humanos, da igualdade das partes e não discriminação e do direito a julgamento justo e conforme, nos termos do artigo 72.º da CRA.

O processo foi à vista do Ministério Público junto deste Tribunal Constitucional.
Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

O Tribunal Constitucional é, nos termos da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional, LPC, competente para julgar os recursos interpostos das sentenças e decisões que contrariem princípios, direitos, garantias e liberdades constitucionalmente consagrados, após o esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos. Esta faculdade está igualmente prevista na alínea m), do artigo 16.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho, Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, LOTC.

III. LEGITIMIDADE

A Recorrente é parte legítima no Processo n.º 953/20, que correu seus trâmites na Câmara do Trabalho do Tribunal Supremo. Tem direito a contradizer, segundo dispõe o n.º 1 do artigo 26.º do CPC, aplicado subsidiariamente ao processo constitucional, por força do artigo 2.º da LPC.

A legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade cabe-lhe, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da LPC.

IV. OBJECTO

O objecto do presente Recurso é aferir se o Acórdão da Câmara do Trabalho do Tribunal Supremo, datado de 12 de Maio de 2022, proferido no Processo n.º 613/17, terá incorrido em inconstitucionalidade, violando direitos fundamentais dos Recorrentes.


V. APRECIANDO

Os Recorrentes interpuseram uma acção de conflito laboral, na 1.ª Secção da Sala de Trabalho do Tribunal Provincial de Luanda, contra a Empresa ENSA Seguros SARL, então entidade patronal nos anos de 1974, 1978 e 1979, respectivamente, vide fls. 205 dos autos, em que solicitavam a inserção no fundo de pensões, a reforma no Instituto Nacional de Segurança Social, bem como o pedido de reintegração do Recorrente José Paulo Casimiro e uma indemnização por danos morais.

O Tribunal a quo julgou improcedente a acção tendo sido absolvida a requerida de todos os pedidos. Inconformados com aquela decisão, interpuseram recurso de apelação junto do Tribunal Supremo que, a fls. 205 a 214, julgou improcedente o recurso mantendo a decisão recorrida.

Socorrendo-se da prerrogativa constitucional do artigo 29.º, vêm os Recorrentes, interpôr o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade porquanto, de sua justiça, o Acórdão prolactado pelo Tribunal ad quem, ofendeu seus lídimos direitos com dignidade constitucional. Especificando que, ao decidir nos termos em que decidiu, violou o valor social do trabalho e da reforma, respeito pelos direitos humanos, que resulta da combinação dos artigos 76.º, 77.º e 90.º, todos da CRA, o princípio da igualdade das partes e não discriminação, artigo 23.º da CRA, e o direito a julgamento justo e conforme, nos termos dos artigos 72.º da CRA.

Cabe apreciar, se assistirá razão aos Recorrentes.

Do que se depreende dos autos, os Recorrentes pretendem uma segunda reapreciação da questão controvertida. Como se sabe, este Tribunal não é mais uma instância da jurisdição comum. As suas competências estão descritas no artigo 181.º da CRA, e resumem-se tão somente sobre a (in) constitucionalidade da decisão recorrida.

Em sede desta Corte de justiça constitucional, os Recorrentes não conseguiram precisar em que medida a decisão impugnada, violou os direitos, liberdades e garantias fundamentais sub judice evocados. Ora, sendo este Tribunal guardião da Constituição, não pode, pois, deixar de emitir seu juízo, mesmo que as alegações pouco ou nada digam, em observância ao artigo 29.º da Constituição da República de Angola.

O referido artigo consigna o direito fundamental ao recurso. No entendimento de J.J. Gomes Canotilho, “o direito de acesso aos Tribunais reconduz-se, essencialmente, no direito a uma solução jurídica de actos e relações jurídicas controvertidas, a que se deve chegar num prazo razoável e com garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões de facto e de direito, oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de causas e outras” (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 6.ª ed., Coimbra: Almedina, 2002, p. 274).

Como bem afirmam os Recorrentes a fls. 236 “todos os Tribunais têm o poder e o dever de assegurar a defesa dos direitos e interesses dos cidadãos, garantir e assegurar a observância da Constituição e da lei, conforme dispõe o n.º 2 do artigo 174.º e n.º 1 do artigo 177.º”. Estes fundamentos estão em harmonia com o princípio da legalidade.

Os Recorrentes, nos termos em que colocam a interposição do presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, pretendem induzir este Tribunal a actuar como se de mais uma instância da jurisdição comum se tratasse. Dos alegados princípios evocados como violados, não conseguiram os Recorrentes precisar em que medida o Acórdão impugnado enferma de inconstitucionalidade. De recordar que não basta, para apreciação desta Corte de justiça constitucional enunciar. É imperioso que as alegações e suas conclusões demonstrem, efectivamente, as violações dos princípios constitucionais.

Os Recorrentes tiveram, a todo tempo, igualdade de armas, em observância do princípio da legalidade, da igualdade e do princípio materializado no acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, enquanto princípios fundamentais e basilares do processo constitucional. Em nada, se vê nos autos denegação de justiça ou algum acto que ofenda a sua dignidade humana enquanto trabalhadores.

Sem necessidade de entrar no mérito da questão, entende esta Corte Constitucional que o Tribunal ad quem, seguiu os marcos de um julgamento justo e conforme nos termos do artigo 72.º da Constituição, da Declaração Universal dos Direitos Humanos que cuidou no seu artigo 8.º e, de igual modo, a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, no seu artigo 7.º. Aliás, como já é jurisprudência firmada por este Tribunal, nos Acórdãos n.ºs 800/2023, 828/2023 e 906/2024 (todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.ao).

O Acórdão recorrido pronunciou-se sobre duas questões, nomeadamente, a de saber se a Decisão ora recorrida é ou não manifestamente injusta pela suposta extemporaneidade da contestação e a de saber se o Tribunal deve ou não julgar procedente a inserção dos apelantes no Fundo de Pensões da ENSA. Tanto numa quanto noutra, os autos apresentam provas documentais em que se vislumbra que os Recorrentes não lograram êxitos nas questões evocadas, vide fls. 212 e 213 dos autos.

Ao debruçar-se sobre as questões levantadas pelos Recorrentes o Tribunal ad quem, fez uma reapreciação das questões suscitadas e pronunciou-se sobre o mérito das mesmas, tendo concluído que não assistia razão aos Recorrentes face as provas carreadas nos autos.

No mais, do que se depreende dos autos, é entendimento deste Tribunal que o Acórdão recorrido não ofendeu os termos de uma decisão justa e conforme.

Nestes termos, não nos resta outro caminho, se não negar provimento ao recurso interposto pelos Recorrentes porquanto, não se descortina no Acórdão que ora se sindica, as sobreditas violações dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos Recorrentes.

Nestes termos,

DECIDINDO

Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em: NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, PORQUANTO O ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO OFENDE OS PRINCÍPIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS INVOCADOS PELOS RECORRENTES.

Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional.
Notifique-se.

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 12 de Março de 2025.

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso (Presidente) (Declarou-se Impedida)

Victória Manuel da Silva Izata (Vice-Presidente)

Carlos Alberto B. Burity da Silva

Carlos Manuel dos Santos Teixeira

Gilberto de Faria Magalhães

João Carlos António Paulino (Declarou-se Impedido)

Josefa Antónia dos Santos Neto (Relatora)

Lucas Manuel João Quilundo

Maria da Conceição de Almeida Sango

Maria de Fátima de Lima D`A. B. da Silva

Vitorino Domingos Hossi