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CONFERÊNCIA NACIONAL SOBRE A MULHER E A VIOLÊNCIA

Intervenção proferida pela Juíza Conselheira Presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso, nesta segunda-feira, 27 de Novembro de 2023, por ocasião da VIª Conferência Nacional sobre a Mulher e a Violência, realizada pelo Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher.

 

VI CONFERÊNCIA NACIONAL SOBRE A MULHER E A VIOLÊNCIA

PREVENIR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E A RAPARIGA PARA FORTALECER A UNIDADE DAS FAMÍLIAS ANGOLANAS.

Exma. Senhora Delfina da Kindanda Secretária de Estado para Família Exma Senhora Ana Celeste Cardoso Secretária de Estados para os Direitos Humanos Exma Senhora Zaira Virane Representante das Nações Unidas em Angola Distintos Convidados;

Minhas Senhoras e Meus Senhores.

Foi com imenso prazer que acedi ao convite para proceder à intervenção inaugural desta VI Conferência Nacional sobre a Mulher e a Violência. Como mulher, ter a oportunidade de proferir estas singelas palavras é, sem dúvida, um enorme privilégio.

Excelências, Caríssimas e Caríssimos presentes,

A violência contra as mulheres, ao longo da história, em diversos momentos e lugares, atingiram proporções alarmantes que puseram em causa o princípio da dignidade da pessoa humana, o que despertou a atenção dos Estados membros das Nações Unidas e não só.

A evolução moral e jurídica das sociedades levou a que, no mundo moderno, as mulheres passassem a ser vistas sob uma perspectiva diferente, numa lógica de igualdade e não discriminação em razão do sexo cfr o artigo 23.º, o nº 2 do artigo 35.º, ambos da Constituição da República de Angola - CRA e o artigo 2º da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Protocolo de Maputo).

Essas directrizes jurídicas constituem mandamentos para que se organize uma agenda institucional de combate à violência contra a mulher, desde à sua infância até às demais fases da vida, o que justifica, mais uma vez, a importância de eventos desta natureza, um espaço para reflectir e desenhar soluções para os problemas aqui em pauta.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, a violência contra a mulher consiste em "qualquer acto de violência de gênero que resulte ou possa resultar em danos ou sofrimentos físicos, sexuais ou mentais para as mulheres, inclusive ameaças de tais actos, coação ou privação arbitrária de liberdade, seja em vida pública ou privada".

A violência contra a mulher manifesta-se sempre que uma rapariga é impedida de frequentar uma escola, para auxiliar a mãe nas tarefas domésticas/no mercado informal/venda ambulante para garantir a subsistência da família; ou quando uma jovem, menor de idade é forçada a um casamento tradicional; manifesta-se, também, sempre que a mulher é diminuída e agredida mental e fisicamente pelo seu cônjuge ou companheiro de união de facto; quando uma mulher é assediada e violentada e quem a devia defender coloca as culpas na vítima por conta da sua aparência física; ou ainda no âmbito laboral em que o reconhecimento do mérito da mulher é condicionado à determinados favores.

Infelizmente, a lista é longa. Trata-se de uma dura realidade que não deve ser ignorada ou minimizada, pois atenta contra a dignidade da pessoa humana, que encontra sua essência protectora na Declaração Universal dos Direitos Humanos e constitui um princípio fundacional do Estado angolano, conforme estabelece o artigo 1.º da Constituição da República de Angola.

A violência contra a mulher, principalmente, quando levada a cabo no seio familiar, representa uma ameaça à estabilidade da família, que como é consabido, constitui o núcleo fundamental da organização da sociedade e é objecto de protecção especial do Estado - cfr. o disposto no artigo 35.º da Constituição da República.

No contexto angolano, face a situação factual e em linha de conta com os instrumentos internacionais de protecção dos direitos da mulher, aprovou-se a Lei n.º 25/11, de 14 de Julho (Lei Contra a Violência Doméstica) e um número considerável de instrumentos normativos que visam, no essencial, combater a Violência Doméstica, Definir a Política Nacional para a Igualdade e Equidade de Género, fixar o Regime Jurídico de Reconhecimento da União de Facto por Mútuo Acordo e Dissolução da União de Facto Reconhecida e o Regime Jurídico de Protecção Social do Trabalhador Doméstico.

A supra referenciada Lei Contra a Violência Doméstica, considera como sendo violência doméstica toda a acção ou omissão que cause lesão ou deformação física e dano psicológico temporário ou permanente que atente contra a pessoa humana. Outrossim, são, também, definidas várias formas de violência contra mulher, sendo as mais frequentes a (i) violência sexual; (ii) violência patrimonial; (iii)violência psicológica; (iv) violência verbal; (v) violência física e; (vi) abandono familiar.

O caminho tortuoso na busca da dignificação e eliminação de todas as formas de violência e discriminação contra a Mulher, encontra igualmente eco na Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável, em especial nos objectivos relativos ao alcance da igualdade de género e empoderamento de todas as mulheres e raparigas, visando o fim da violência contra as mulheres e raparigas e a disponibilização de protecção social.

Diante deste cenário, atendendo aos instrumentos internacionais ratificados por Angola e os tipos de violência mais frequentes no nosso país, a prevenção da violência contra a mulher e a rapariga deve passar pelos seguintes postulados:

a) Adoptar as medidas legislativas adequadas com sanções devidamente definidas, proibindo toda a forma de discriminação contra a mulher;

b) Assegurar o desenvolvimento e o progresso das mulheres, garantindo-lhes o exercício e a satisfação dos direitos e liberdades fundamentais numa base de igualdade com os homens;

c) Garantir a educação da família que inclua a compreensão correcta da maternidade como função social e a responsabilidade comum dos homens e das mulheres na educação dos filhos e das filhas;

d) Aprovar políticas adequadas para reprimir todas as formas de tráfico de mulheres, exploração e prostituição;

e) Eliminar preconceitos, costumes e práticas baseadas na ideia de superioridade do homem sobre a mulher, pois, não são dignos de força jurídica, porque atentam contra a Constituição e a dignidade da pessoa humana;

f) Melhorar a rede de atendimento, apoio e acolhimento às vítimas de violência e promover a divulgação e sensibilização sobre a violência doméstica;

g) Dar continuidade ao combate ao tráfico de mulheres e à exploração comercial de mulheres adolescentes/jovens e adoptar as recomendações previstas nos tratados internacionais na área de violência contra as mulheres;

h) Apostar na prevenção, através de acções de sensibilização que concorram para a diminuição de casos de violência contra a Mulher;

i) Melhorar e alargar o apoio às vítimas de violência, garantindo um atendimento mais humanizado e qualificado, por meio da formação continuada de agentes públicos e comunitários;

j) Reforçar acções educativas e culturais que disseminem atitudes igualitárias e valores éticos que combatam a violência;

k) Realizar campanhas publicitárias e palestras com o intuito de sensibilizar a população e incentivar à denúncia sobre todas as formas de violência contra a Mulher;

i) Formar as famílias e os agentes policiais na prevenção de casos de tráfico de mulheres e raparigas.

Sem prejuízo do quadro de possíveis soluções descrito, é importante referir que, para sermos bem-sucedidos como nação, nesta espinhosa batalha, não devemos deixar essa tarefa apenas aos cuidados do Estado, pois o sucesso requer a participação de todos! No seio familiar, nas escolas, nos institutos, nas universidades, nas empresas, nas igrejas, na comunidade, nana sociedade em geral, está a continuação da luta contra este flagelo, pois a violência contra a Mulher tem contornos transversais, fazendo como suas vítimas pessoas de diferentes classes sociais, proveniências, idades, religiões, estados civis, escolaridade ou raças.

Excelências,

Um dos grandes instrumentos de combate à violência contra a mulher é a educação. É necessário apostarmos na educação da mulher e do homem a todos os níveis, e criar as condições materiais e financeiras de protecção.

Destaco aqui a importância de trabalharmos todos no aumento da cultura de denúncia contra a violência sexual às mulheres e às raparigas, que têm vindo a crescer, para que os responsáveis sejam julgados e, havendo culpa, condenados.

A violência inibe o empoderamento da mulher a todos os níveis, pois limita a sua capacidade de agir e de escolha. Reflecte e reforça as desigualdades entre o homem e a mulher em clara violação aos direitos, liberdades e garantias fundamentais.

Excelências, distintos participantes,

Termino a minha intervenção, augurando que nesta conferência, e nas actividades subsequentes, tal qual nos encontros de família, sejam abordadas as questões candentes e aventadas soluções capazes de gerarem melhorias no dia a dia das mulheres angolanas, em particular, e das nossas famílias, de um modo geral.

Muito obrigada pela Vossa audiência.