ACÓRDÃO N.º 898/2024
PROCESSO N.º 1139-C/2024
Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade
Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
José Eduardo Pemba e Natália Cristina, com os melhores sinais de identificação nos autos, vieram ao Tribunal Constitucional, nos termos da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC) interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 2610/2019, da 1.ª Secção da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo, datado de 25 de Agosto de 2022.
Os Recorrentes, notificados para apresentar as suas alegações, ao abrigo do disposto no artigo 45.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC) arregimentaram-nas, em resumo, nos termos seguintes:
1. Interpuseram recurso de apelação contra o Despacho Saneador-Sentença que julgou e decidiu a acção de Reivindicação de Propriedade, sob forma de Processo Declarativo Ordinário, que correu termos na Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Benguela, sob o n.º 893/015, que julgou procedente a presente acção, porque provada e em consequência condenou os Recorrentes nos pedidos formulados pelo Recorrido, com fundamento dos Recorrentes habitarem no quintal sem qualquer título.
2. Assim, em cumprimento do direito ao recurso, os Recorrentes apresentaram as suas alegações no Tribunal Supremo, juntando documentos supostamente tidos como omissos nos autos, pretendendo provar a sua titularidade, para todos os efeitos legais, documentos passados pela Secretaria de Estado da Habitação, na qualidade de proprietária do património em questão.
3. Os Recorrentes provam a titularidade do espaço que ocupam enquanto detentores de um direito adquirido da Secretaria da Estado da Habitação, infelizmente, pela parcialidade na douta decisão proferida no Acórdão, o Mui Augusto Tribunal “ad quem” acordou em negar provimento ao presente recurso, e em consequência confirmar a decisão recorrida.
4. Em face do que antecede, a decisão recorrida viola as disposições constitucionais, designadamente, os artigos 72.º, 175.º e 177.º da Constituição da República de Angola, uma vez que resulta claramente dos autos que tal decisão não tem por base a aplicação de qualquer disposição legal que prova a falta de titularidade do espaço que ocupam os Recorrentes.
5. Ora, nos termos da Constituição, no exercício da função jurisdicional, compete aos Tribunais dirimir conflitos de interesses público ou privado, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, bem como os princípios do acusatório e do contraditório e reprimir as violações da legalidade democrática.
6. Compete aos Tribunais a afirmação do direito e a realização da Justiça. Mas o direito e a justiça são concretizados por leis. Não se pode prescindir da segurança jurídica que é dada pelas leis quando indicam o caminho a ser seguido para que se aceda àqueles dois desideratos.
7. A decisão recorrida viola, ostensivamente, o princípio da certeza jurídica, segundo o qual deve consubstanciar-se em normas de carácter geral formuladas com a precisão indispensável para que os sujeitos, seus destinatários as possam conhecer e, assim, orientar as suas condutas tendo-as em consideração.
8. A decisão recorrida viola, igualmente, os princípios da legalidade e de um julgamento justo, ao tomar uma decisão sem qualquer suporte legal, isto é, não tendo por base qualquer disposição legal.
9. Assim, mal andou o Tribunal a quo bem como o ad quem, ao decidirem como decidiram, sem ter em conta as leis do confisco e do património do Estado (Lei n.º 3/76, de 3 de Março, Lei n.º 43/76, de 19 de Junho, Lei n.º 7/95, de 1 de Setembro e o Decreto Executivo Conjunto n.º 29/92, de 12 de Junho).
Terminam pedindo que seja dado provimento ao presente recurso e, por via dele, seja revogada a decisão recorrida por estar em desconformidade com a Constituição da República de Angola, designadamente, por violação dos princípios da legalidade, da certeza jurídica e do direito a julgamento justo e conforme, nos termos do disposto nos artigos 72.º, 175.º, n.º 1 do 177.º e n.º 1 do artigo 179.º, todos da CRA e nos artigos 1345.º e 1415.º, ambos do Código Civil.
O processo foi à vista do Ministério Público que, em resumo, promoveu o seguinte:
“(…) Na verdade, constata-se que ao longo de toda a tramitação processual foi dada aos Recorrentes a oportunidade de provarem a titularidade do espaço que ocupam. Porém, não o fizeram porque os tribunais recorridos (a quo e ad quem) entenderam, na sua livre convicção, que os documentos por eles apresentados, face aos do autor, não constituem, do ponto de vista legal, títulos ou formas de aquisição de direito de propriedade sobre o referido imóvel.
Cabe, aliás, referir que foi também com fundamento na falta de apresentação de documentos referentes à titularidade do espaço a favor dos Recorrentes, que a Repartição Fiscal de Benguela, depois de ter procedido à inscrição do mesmo, sob o n.º 10199, veio comunicar-lhes a sua anulação.”
Colhidos os vistos legais, dos Venerandos Juízes Conselheiros, cumpre, agora, apreciar para decidir.
II. COMPETÊNCIA
O presente recurso foi interposto nos termos e com os fundamentos da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), norma que estabelece o âmbito do recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional, de “sentenças dos demais tribunais que contenham fundamento de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstas na Constituição da República de Angola.”
Ademais, foi observado o requisito do prévio esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos, nos tribunais comuns e demais tribunais, conforme estatuído nas disposições conjugadas do parágrafo único do artigo 49.º e do artigo 50.º, ambos da LPC, pelo que dispõe o Tribunal Constitucional de competência para apreciar o presente Recurso.
III. LEGITIMIDADE
A legitimidade para o Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade cabe, no caso de sentença, à pessoa que, de harmonia com a lei reguladora do processo em que a decisão foi proferida, possa dela interpor recurso, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da LPC.
Igualmente tem legitimidade para recorrer, aquele que, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido, nos termos do n.º 1 do artigo 680.º do CPC, aqui aplicado por esta Corte, ex vi do artigo 2.º da LPC, que estabelece a aplicação subsidiária das normas do Código de Processo Civil aos processos de natureza jurídico-constitucional.
No caso em concreto, os ora Recorrentes, enquanto parte no Processo n.º 2610/19, que não viram a sua pretensão atendida, têm decerto legitimidade para recorrer.
IV. OBJECTO
O objecto do presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade é o Acórdão da 1.ª Secção da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo, proferido no dia 25 de Agosto de 2022, no âmbito do Processo n.º 2610/19, e cabe ao Tribunal Constitucional apreciar se o mesmo violou princípios, direitos ou garantias fundamentais previstos na Constituição da República de Angola, nomeadamente, o princípio da legalidade e o direito a julgamento justo e conforme.
V. APRECIANDO
É submetido à apreciação do Tribunal Constitucional o Acórdão da 1.ª Secção da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo que negou provimento ao recurso interposto e, em consequência, confirmou a decisão recorrida.
É inevitável referir, que os ora Recorrentes foram parte num processo que correu termos na Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Benguela onde, contra eles, havia sido intentada uma acção de reivindicação da propriedade por alegadamente estarem a residir de forma ilegítima no anexo (quintal) da fracção autónoma B-2, prédio n.º 63.º, 1.º andar, sita na Rua João de Deus, gaveto com a Rua Miguel Bombarda, com a Matriz Predial n.º 1885, registado sob o n.º 364, na Conservatória do Registo Predial de Benguela.
A decisão do Tribunal a quo foi-lhes desfavorável, visto que condenou os ora Recorrentes em todos os pedidos formulados, reconhecendo o então Autor, o Senhor João Oliveira, como legítimo proprietário do imóvel acima referenciado. Inconformados, interpuseram recurso de apelação junto da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo que, em Acórdão, negou provimento às pretensões daqueles e confirmou a decisão recorrida (fls. 203 a 210 dos autos).
Conforme se verifica a fls. 282 e 283 dos autos, asseveram os Recorrentes que provaram a titularidade do espaço que ocupam e enquanto detentores de um direito adquirido por via da Secretaria de Estado da Habitação, infelizmente, pela parcialidade na douta decisão proferida no Acórdão, o Tribunal ad quem, decidiu negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a decisão recorrida, olvidando, obviamente, de mencionar claramente as normas jurídicas violadas, nomeadamente, a Lei n.º 3/76, de 3 de Março, a Lei n.º 43/76, de 19 de Junho, a Lei n.º 7/95, de 1 de Setembro e o Decreto Executivo Conjunto n.º 29/92, de 12 de Junho).
Destarte, apontam que a decisão recorrida deve ser revogada por estar em desconformidade com a Constituição, designadamente por violação do princípio da legalidade e do direito a julgamento justo e conforme, nos termos do disposto nos artigos 72.º, 175.º, n.º 1 do 177.º e 179.º, todos da Constituição da República de Angola e artigos 1345.º e 1415.º, ambos do Código Civil.
Ab initio, verifica-se que os Recorrentes nas suas alegações, de modo geral, instam ao Tribunal Constitucional, uma reapreciação da causa como se de mais uma instância da jurisdição comum se tratasse.
Vale, antes de mais, referir que os Recorrentes beneficiaram do duplo grau de jurisdição, que se infere do artigo 29.º da CRA. Sobre o assunto Djanira Maria Radamés de Sá (1999) assevera que o duplo grau de jurisdição consiste na “(...) possibilidade de reexame, de reapreciação da sentença (…) proferida em determinada causa, por outro órgão de jurisdição que não o prolator da decisão, normalmente de hierarquia superior” (Duplo Grau de Jurisdição: Conteúdo e Alcance Constitucional, Editora Saraiva, p. 88).
Decorre dos artigos 6.º, 28.º e 181.º da CRA e em legislação infra-constitucional nas disposições constantes no artigo 49.º e seguintes, da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), que no recurso extraordinário de inconstitucionalidade não se procede a uma reapreciação da causa, mas apenas a título extraordinário, verifica-se a conformidade da decisão recorrida com os princípios, direitos, liberdades e garantias fundamentais previstos na Constituição.
Pelo que, no caso em apreço cabe a este Tribunal tão-somente verificar se o Acórdão recorrido está ou não em conformidade com os princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição e não se debruçar sobre cada aspecto do processo em análise.
Na mesma senda, entende Carlos Blanco de Morais que: “(…) O Tribunal Constitucional…deve abster-se de julgar, ou mesmo de se pronunciar sobre o mérito da questão de fundo que está a ser julgada no processo principal, já que lhe cumpre, apenas, administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional. Não opera deste modo, como uma instância suprema de mérito, ou um tribunal de super-revisão, investido em poderes substitutivos, já que lhe não compete apreciar a justeza da decisão jurídica segundo o direito ordinário aplicado no processo principal” (Justiça Constitucional, o Direito do Contencioso Constitucional, Tomo II 2.ª ed., Coimbra Editora, p. 619).
Inobstante a isso, veja-se, pois, se assistir-lhes-á razão.
Importa sublinhar que o princípio da legalidade tem como principal fundamentação a garantia da segurança jurídica e a protecção dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos. Ao estabelecer que todos, inclusive os órgãos do Estado, estão sujeitos à lei, este princípio busca assegurar a previsibilidade das acções do poder público e a confiança dos cidadãos no sistema jurídico.
Os Recorrentes advogam que a decisão recorrida ofende ao princípio acima mencionado porque carece de fundamentação, uma vez que o tribunal ad quem se limitou a reproduzir os mesmos argumentos aduzidos pelo tribunal a quo.
Este princípio vem consagrado no n.º 2 do artigo 6.º da Constituição da República de Angola, segundo o qual, “O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade, devendo respeitar e fazer respeitar as leis”.
É fulcral não se olvidar que o princípio da legalidade, alicerçado no princípio do Estado de Direito, tem como corolário o princípio da legalidade da função jurisdicional, em conformidade com o estabelecido nas disposições combinadas dos artigos 2.º, 6.º e 72.º, todos da CRA, o que traduz o imperativo da vinculação desta actividade à lei, configurando pressuposto essencial à excelente administração da justiça (vide, entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional, n.º 857/2023, de 15 de Novembro, disponível em www.tribunalconstitucional.ao).
Jónatas Machado, Paulo Nogueira da Costa e Esteves Carlos Hilário (2017) ao discorrerem sobre esta matéria elucidaram in verbis: “(…) De acordo com este princípio, os tribunais carecem de uma base legal e constitucional para a sua existência e organização. Este princípio implica, naturalmente, que os tribunais podem em si mesmos violar normas constitucionais e legais, devendo as suas decisões serem avaliadas do ponto de vista da sua conformidade com a Constituição e com as demais normas jurídicas relevantes” (Direito Constitucional Angolano, 4.ª ed., Petrony Editora, p. 76).
Por sua vez, Joaquim Gomes Canotilho (2003) discorre o seguinte relativamente ao princípio: “O princípio da legalidade postula dois princípios fundamentais: o princípio da supremacia ou prevalência da lei (Vorrang des Gezetses) e o princípio da reserva da lei (vorbehalt des Gesetzes). Estes princípios permanecem válidos pois num Estado democrático constitucional a lei parlamentar é, ainda, a expressão privilegiada do princípio democrático (daí a sua supremacia) e o instrumento mais apropriado e seguro para definir os regimes de certas matérias, sobretudo os direitos fundamentais e da vertebração democrática do Estado (daí a reserva da lei)” (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª ed. Almedina p. 256).
Acerca deste princípio, a jurisprudência desta Corte ressoa:“ (…) o Tribunal Constitucional, na sedimentação da sua jurisprudência tem reiterado a essencialidade do princípio da legalidade enquanto princípio garantia do Estado de Direito, ao abrigo do qual deve ser alicerçada a actividade de quaisquer órgãos do poder do Estado, neste se incluindo, obviamente, todos os tribunais” (Acórdão n.º 876/2024, de 5 de Março, disponível em: www.tribunalconstitucional.ao).
Assim sendo, constata-se que o aresto sob sindicância não ofende o princípio da legalidade, porquanto, compulsados os autos, verifica-se que a decisão recorrida foi prolactada tendo como fundamento os pressupostos legais acima referenciados.
No que concerne ao direito a julgamento justo e conforme, vem este consagrado no artigo 72.º da CRA, segundo o qual, “a todo o cidadão é reconhecido o direito a julgamento justo, célere e conforme a lei”. De igual modo, este direito está consagrado no artigo 8.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e no artigo 7.º da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.
Do ponto de vista doutrinário, para que o julgamento seja justo e conforme, é imperioso que se verifique o pressuposto da imparcialidade e independência dos juízes, que o julgamento esteja em conformidade com os princípios da equidade e igualdade de armas, que seja atribuído o direito a assistência e ao patrocínio judiciário às partes, no sentido de que estas possam, efectivamente, exercer na íntegra o direito a ampla defesa, o direito ao recurso e que a demanda tramita e seja decidida dentro dos parâmetros estabelecidos na Constituição e na lei.
Este princípio constitucional tem como objectivo assegurar um julgamento justo e em conformidade com os ditames legais, em decorrência de um processo equitativo, capaz de garantir a justiça material e uma decisão dentro de um prazo razoável respeitando os procedimentos judiciais tais como a celeridade e prioridade de modo a obter a tutela efectiva em tempo útil contra ameaças ou violações dos seus direitos.
Segundo Raul Araújo e Elisa Rangel Nunes (2014), “o Direito a julgamento justo é um pressuposto do Estado Democrático de Direito e uma garantia que supõe a existência de uma administração da justiça funcional, imparcial e independente. Ela tem de assegurar um julgamento público e num prazo razoável e garantias de defesa material” (Constituição da República de Angola, Anotada, Tomo I, Gráfica Maiadouro, p. 398).
Igualmente, é jurisprudência desta Corte Constitucional que, “o direito a julgamento justo e conforme é um direito fundamental que visa, essencialmente, concretizar o afastamento dos casos de injustiça e amparar os cidadãos contra intervenções estatais arbitrárias, dando-lhes segurança, para que não sejam privados dos seus direitos e interesses legalmente previstos e protegidos, sem antes enfrentarem um julgamento nos termos da lei vigente” (vide Acórdão n.º 780/2022, de 3 de Novembro, disponível em www.tribunalconstitucional.ao).
Nesta mesma linha de raciocínio destaca-se o posicionamento desta jurisdição constitucional ipsis lettiris: “quando a interpretação feita pela jurisdição comum no Aresto recorrido é conforme a CRA, por ser fundamentada em legislação subsidiariamente aplicável ao caso concreto, e garantindo-se o direito a ampla defesa, que é um direito com dignidade constitucional, permitindo-se que as partes apresentem todos os argumentos de razão a seu favor perante o julgador com o objectivo de influenciá-lo, direito este que é uma manifestação do direito ao contraditório, que por sua vez concretiza o direito a um julgamento justo e conforme, estabelecido no artigo 72.º da CRA” (Acórdão n.º 606/2020, de 14 de Março).
Volvendo ao caso em apreço, constata-se nos autos, a fls. 203-210, que na decisão recorrida o Tribunal Supremo fundamentou da seguinte forma: “Compulsados minuciosamente os autos, verificamos, em primeiro lugar que, aquando da entrega da contestação, os Réus não juntaram qualquer documento relativamente à titularidade do imóvel (…), ou seja, não fazem prova seja à que título, a forma como adquiriram o quintal, objecto do presente litígio, isto apesar de terem a sua posse desde data anterior à data de aquisição por parte do Autor”.
Prosseguiu aquela instância jurisdicional que: “Este último, [o Autor da acção], pelo contrário, fez juntar diversos documentos, entre os quais, a Escritura Pública de compra e venda do imóvel em referência (…), a partir dos quais se verifica que o referido quintal, nas distintas aquisições, sempre fez parte do imóvel que o mesmo reclama”.
Pelo fio do exposto, neste caso em concreto, o Tribunal Supremo fundamentou a sua decisão com base na legislação vigente sobre a matéria e procurou valorar as provas dentro dos critérios permitidos por lei e com base nisso formou a sua convicção no sentido da improcedência dos pedidos formulados pelos aqui Recorrentes, cuja apreciação meritória não se enquadra no escopo desta jurisdição constitucional.
Registe-se, de igual modo, que os Recorrentes em sede da presente causa tiveram a oportunidade de carrear todos os meios de prova que detinham e com isso influenciar o julgador, estiveram em igualdade de circunstâncias com a contraparte e beneficiaram da reapreciação da sua causa, por parte de um Tribunal superior. No entanto, as suas pretensões não lograram êxito, apesar do seu inconformismo, verifica-se que o julgamento ocorreu dentro dos padrões de justiça material e num prazo razoável.
Destarte, este Tribunal considera que o Aresto sob sindicância não ofendeu, igualmente, o direito a julgamento justo e conforme.
Aqui chegados, e dilucidada a questão nos termos relatados, esta Corte Constitucional conclui que, efectivamente, o Aresto recorrido não afronta o princípio da legalidade e o direito a julgamento justo e conforme, consagrados na Constituição da República de Angola.
Nestes termos,
DECIDINDO
Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em: NEGAR PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE INCONSTITUCIONALIDADE, POR NÃO SE VERIFICAR QUAISQUER OFENSAS AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E AO DIREITO A JULGAMENTO JUSTO E CONFORME.
Custas pelos Recorrentes, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional.
Notifique-se.
Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 02 de Julho de 2024.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dra. Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso (Presidente)
Dra. Victória Manuel da Silva Izata (Vice-Presidente e Relatora)
Dr. Carlos Alberto B. Burity da Silva
Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira
Dr. Gilberto de Faria Magalhães
Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto
Dra. Júlia de Fátima Leite S. Ferreira
Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango
Dra. Maria de Fátima de Lima D`A. B. da Silva