Loading…
TC > Jurisprudência > Acórdãos > Acórdão N.º 1028/2025

ACÓRDÃO N.º 1028/2025 
 
PROCESSO N.º 1126-B/2023 
Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade (Arguição de Nulidade) 
Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional: 
I.  RELATÓRIO  
Pedro Lussati, com mais sinais de identificação nos autos cotados em epígrafe, inconformado com o Acórdão n.º 922/24, de 06 de Novembro, prolatado por esta Corte Constitucional, vem dele arguir nulidade, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 e no n.º 3 do artigo 668.º do Código de Processo Civil (CPC), por remissão do artigo 716.º do CPC, aplicáveis ao processo constitucional ex vi do artigo 2.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), arrimando para o efeito, em síntese, os fundamentos que se seguem: 
No Aresto n.º 922/2024 do Tribunal Constitucional, exarado no processo n.º 1126-B/2024, que correu os seus termos no Plenário do Tribunal Constitucional, vislumbra-se que este Tribunal não apreciou todas as questões de inconstitucionalidade objecto do Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade interposto, cabalmente delimitadas pelas conclusões das alegações apresentadas. 
Deste modo, o ora Reclamante entende que o aresto em questão padece de vício de omissão de pronúncia, cristalizado nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do CPC, susceptível de arguição perante o Tribunal Constitucional. 
Nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do CPC, diz-se que: "quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento". 
Impunha-se ao Tribunal Constitucional pronunciar-se no sentido de esclarecer se, no caso do, então, Recorrente, o excesso dos prazos ordinários e extraordinários determina excesso de prisão preventiva e se viola ou não o direito fundamental de liberdade física individual de locomoção, com amparo nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 36.º da CRA. 
Deveria o Tribunal Constitucional ter esclarecido se a prisão preventiva mantida em excesso dos prazos ordinários e extraordinários, determina, no ordenamento jurídico pátrio, violação do princípio da proibição do excesso e de prisões ilegais, tal como o ora Reclamante fez alusão ao citar o disposto no n.º 1 do artigo 57.º e no artigo 64.º, ambos da CRA. 
E, bem assim, se a prisão preventiva sob excesso dos prazos ordinários e extraordinários é compatível com o disposto nos artigos 1.º e 2.º ambos da CRA, relativamente ao direito a dignidade da pessoa humana, bem como o primado do Estado Democrático de Direito. 
Mediante as conclusões de recurso materializadas nas alegações, deveria o Tribunal Constitucional resolver as questões levantadas, sobre o excesso de prisão preventiva, a violação do direito fundamental de liberdade individual fisica de locomoção, o princípio da proibição do excesso, o princípio da proibição de privação da liberdade ilegal e arbitrária, o princípio da precariedade da medida de prisão preventiva, o princípio da dignidade da pessoa humana, a legalidade democrática e o primado do Estado de Direito. 
Fazendo um exame ao aresto acima mencionado, facilmente se vislumbra que o Tribunal não logrou conhecer e resolver as questões acima mencionadas, pois inexiste qualquer apreciação sobre as mesmas. O Tribunal Constitucional deixou de se pronunciar, sendo que as questões de inconstitucionalidades são transversais, devendo o Tribunal delas conhecer oficiosamente, ainda que não suscitadas. 
Apesar de devidamente alegado, o Tribunal deixou de apreciar se a manutenção da prisão preventiva sob excesso dos seus prazos máximos viola o princípio da presunção de inocência, o princípio da dignidade da pessoa humana, o direito a julgamento justo e conforme à lei, a proibição de tratamento degradante e cruel e desumano, o princípio do processo democrático e, bem assim, o princípio da igualdade. 
O ora Reclamante arguiu, nas suas alegações de recurso, a violação do direito de propriedade privada, em virtude de os seus bens terem sido transferidos para a titularidade do Estado, bem como por terem sido colocados à venda sem que a decisão condenatória tivesse transitado em julgado. 
Deste modo, em síntese, diz-se que o Tribunal Constitucional não se pronunciou sobre as seguintes questões de inconstitucionalidade: 
Violação do direito à liberdade física individual de locomoção (ir, vir e permanecer) em virtude do prolongamento ilegal e arbitrário da prisão preventiva sob o excesso dos prazos ordinário e extraordinário (...); 
Violação do princípio da presunção de inocência, da igualdade de tratamento, da proibição de tratamento degradante e desumano, da dignidade da pessoa humana, do processo democrático, por efeito do pelo prolongamento da medida de prisão fora dos prazos máximos previstos legalmente pelo legislador constituinte e ordinário; 
Nulidade do Aresto do Tribunal Supremo, por omissão de pronúncia; 
Violação do princípio do julgamento justo e conforme à lei, por privação ilegal da liberdade individual física de locomoção, havendo excesso dos prazos ordinários e extraordinários cominados legalmente; 
Violação do direito à defesa, do princípio do contraditório e do direito ao processo justo, pelo facto de o arguido ter prestado declarações contra si mesmo, no denominado programa televisivo "o banquete-operação caranguejo”, sem que tivesse intervindo a sua defesa; 
O princípio da precariedade da prisão preventiva, devidamente mencionado no n.º 1 do artigo 66.º da CRA; 
O princípio da legalidade democrática e do Estado de Direito, incompatíveis com o prolongamento ilegal da prisão preventiva sob excesso dos prazos máximos, ordinários e extraordinários legalmente cominados. 
Assim sendo, porque são questões levantadas pelo ora arguente em sede da sua peça de alegações de recurso e, devidamente, expendidas nas conclusões do mesmo, torna-se por demais evidente que o Tribunal Constitucional está obrigado a pronunciar-se, porque se trata de matérias jurídico-constitucionais. 
Termina o Reclamante peticionando a declaração de nulidade do Aresto do Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 922/2024, proferido no Processo n.º 1126-B/2023), por omissão de pronúncia, por força do disposto nos termos do n.º 2 do artigo 660.º, conjugado com a alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º, com o artigo 153.º, com o n.º 3 do artigo 670.º e com o artigo 716.º, todos do CPC, aplicáveis por força do artigo 2.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho. 
Prescindindo da vista e dos vistos legais nos termos do n.º 2 do artigo 716.º do CPC, atenta a simplicidade da presente reclamação, cumpre, agora, apreciar para decidir. 
 
II.  COMPETÊNCIA 
 
Conforme consignado no n.º 3 do artigo 668.º do CPC, tratando-se da nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, a mesma é arguível em sede de recurso ordinário, excepto quando que a decisão cuja nulidade se invoca já não admite recurso, caso em que a arguição se fará em sede de reclamação para o Tribunal que prolatou a decisão. 
 
Destarte, e nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 668.º, no n.º 2 do artigo 666.º, na alínea a) do artigo 669.º e no artigo 670.º, todos do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 2.º da LPC, é esta Corte Constitucional competente para conhecer e decidir das reclamações que recaiam sobre os Acórdãos por si exarados no exercício da competência prevista nos artigos 49.º e 53.º da LPC, uma vez que, dessas decisões, não cabe qualquer recurso.  
 
III. LEGITIMIDADE 
 
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 26.º e no n.º 1 do artigo 203.º, ambos do CPC, aplicáveis, subsidiariamente, aos processos sujeitos à jurisdição do Tribunal Constitucional, ex vi do artigo 2.º da LPC, a legitimidade para arguir nulidades é, em geral, deferida pela lei ao interessado na observância da formalidade ou na repetição ou eliminação do acto. 
  
Tendo o ora Reclamante intervindo como Recorrente no processo em que foi proferido o Acórdão cuja nulidade agora invoca, por motivo de falta de pronunciamento do Tribunal ad quem acerca de algumas das inconstitucionalidades então arguidas, não restam dúvidas acerca da legitimidade processual do Reclamante. 
 
IV.  OBJECTO 
 
O objecto da presente reclamação é aferir se o Acórdão n.º 922/2024, de 06 de Novembro, prolatado por esta Corte Constitucional, enferma da nulidade arguida pelo Reclamante com fundamento na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º e no artigo 716.º, ambos do CPC. 
 
V.  APRECIANDO 
 
O Reclamante, notificado dos Acórdãos n.ºs 922/2024, de 06 de Novembro, e 922-A/2024, de 17 de Dezembro, ambos prolatados pelo Tribunal Constitucional, vem arguir, em sede de reclamação, a nulidade do primeiro Acórdão, porquanto, na sua óptica, o mesmo enferma de vício de omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC.  
 
Entende o Reclamante que o Aresto em causa não responde a várias questões de inconstitucionalidade por si colocadas nas alegações e bem individualizadas nas respectivas conclusões, nomeadamente as atinentes ao excesso de prisão preventiva, à nulidade do Acórdão recorrido por omissão de pronúncia, à prestação de declarações contra si mesmo e à violação da propriedade privada por motivo de afectação do seu património à esfera jurídica do Estado, antes de uma sentença condenatória transitada em julgado. 
Na tese do Reclamante, as questões por si levantadas nas alegações de recurso e que, no seu entender, não foram objecto de pronunciamento por parte do Tribunal Constitucional são susceptíveis de violar princípios, direitos, liberdades e garantias com consagração constitucional, nomeadamente o princípio da dignidade da pessoa humana (incluindo a concomitante proibição de tratamento desumano ou degradante), o princípio da igualdade, o princípio da tutela jurisdicional efectiva, o direito à liberdade individual, o princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, o direito de propriedade privada, o direito a julgamento justo e conforme e a garantia  constitucional com incidência processual penal de presunção de inocência. 
É entendimento do Reclamante que, uma vez regularmente alegadas, as questões de inconstitucionalidade vinculam o Tribunal Constitucional, enquanto instância ad quem, a um pronunciamento, tal como prescreve o n.º 2 do artigo 660.º do CPC, sendo a omissão de pronúncia sobre aquelas questões, no seu todo ou apenas em parte, causa de nulidade da decisão, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, invalidade essa que o disposto no artigo 716.º do CPC estende às decisões das instâncias superiores. 
Assistir-lhe-á razão? 
Nos termos do consignado no n.º 2 do artigo 660.º do CPC, o Tribunal “(…) deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.”  
Trata-se de uma clara manifestação do princípio do dispositivo quanto ao thema decidendum. A decisão deve restringir-se ao objecto que as partes deduziram. Os fundamentos e a parte dispositiva de uma decisão devem ser construídos de modo a dar resposta aos problemas fundamentais com que as partes construíram a causa de pedir, os pedidos ou as excepções e não em jeito de resposta aos raciocínios em que as partes suportam as suas posições.  
Neste circunspecto, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes, sendo que só as primeiras vinculam o Tribunal.  
Diz Cardona Ferreira que “as situações inseríveis na alínea d) [do n.º 1 do artigo 668.º] referem-se a questões e não a argumentos. O juiz não é obrigado a esgotar a análise dos argumentos, mas, apenas, a explicitar e considerar todas as questões que devam ser conhecidas e só essas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente (Guia de Recursos em Processo Civil (Declarativo), 2.ª ed., Coimbra Editora, 2003, pág. 31). 
Assevera Alberto dos Reis que: “(…) São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer da questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 3.ª ed., Coimbra Editora, 2012, pág. 143). 
Assim, a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição do pleiteante, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, com o pedido e com as excepções deduzidas e não quando ocorre, tão só, mera ausência de discussão das razões ou dos argumentos invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas. Vide, neste sentido, LEBRE DE FREITAS, A Acção Declarativa Comum, Coimbra Editora, 2000, pág. 299. 
Para a concretização do dever de pronúncia por parte do Tribunal ad quem, é mister definir, em cada caso, o objecto do recurso. Nos termos do disposto no artigo 690.º do CPC, aplicável, ex vi do artigo 2.º da LPC, o âmbito material do recurso afere-se pelo conteúdo das conclusões das respectivas alegações, pelo que daí resultará o âmbito temático da apreciação, sendo certo que esta Corte Constitucional tem o seu poder de cognição limitado, em sede de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, à integral observância dos princípios, direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados por parte da decisão recorrida. 
Outrossim, e porque se trata de contencioso de decisões judiciais, o âmbito material da análise desta Corte Constitucional cingir-se-á, necessariamente, ao conteúdo efectivo da decisão do Tribunal recorrido. 
 
Sobre a omissão de pronúncia relativa ao excesso de prisão preventiva 
 
Nas alegações submetidas a este Tribunal, o Recorrente Pedro Lussati arguiu a inconstitucionalidade da medida de coacção de prisão preventiva a que estava sujeito, com fundamento no facto de terem decorrido, ante a ausência de qualquer decisão condenatória com trânsito em julgado e mesmo antes da interposição do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, os prazos (ordinário e extraordinário) de prisão preventiva legalmente estabelecidos. O Acórdão n.º 922/24, exarado pelo Plenário do Tribunal Constitucional a 6 de Novembro, é omisso quanto à alegada inconstitucionalidade da medida de coacção de prisão preventiva.  
Deveria esta Corte Constitucional ter-se pronunciado sobre esta questão? 
Não obstante o dever de pronúncia do julgador que decorre do n.º 2 do artigo 660.º do CPC, o Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade do Processo n.º 1126-B/23, no qual foi prolatado o Aresto n.º 922/24, cuja nulidade aqui se reclama, tem por objecto o Acórdão exarado pela 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo no Processo n.º 6217/23, no âmbito do qual esta questão não foi apreciada. 
Nesta conformidade, tendo o recurso (no âmbito do qual foi prolatado o Acórdão ora reclamado) por objecto a decisão do Tribunal a quo, nos exactos termos em que foi exarada, e não tendo a mesma abordado a questão de facto e de direito acerca da qual o Recorrente alega inconstitucionalidade, não caberia a esta Corte Constitucional dela tomar conhecimento.  
Ainda que o ora Reclamante haja, nas alegações com que instruiu o recurso junto da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, arguido a questão da ilegalidade da prisão preventiva a que estava submetido, tendo aquele Tribunal omitido pronúncia sobre tal questão, há que realçar que tal omissão de pronúncia não foi arguida em sede do recurso extraordinário de inconstitucionalidade impetrado junto deste Tribunal. Foi, sim, arguida a própria inconstitucionalidade da medida de prisão preventiva a que o, então, Recorrente, estava sujeito, sem que o Tribunal recorrido se tivesse anteriormente pronunciado sobre a matéria.   
Sublinhe-se, ainda, que, perante a falta de pronúncia por parte do Aresto da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, deveria o interessado ter arguido, então, a nulidade da decisão, ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, mediante a competente reclamação junto do Tribunal que a proferiu, nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 3.º do CPP e do n.º 3 do artigo 668.º do CPC, esgotando, assim, a jurisdição comum quanto a este quesito. 
Outrossim, à data da interposição do recurso extraordinário de inconstitucionalidade que motivou a decisão ora reclamada, em cujas alegações foi suscitada a questão da inconstitucionalidade da situação carcerária do arguido, corria já os seus termos no Tribunal Constitucional um outro recurso extraordinário de inconstitucionalidade, autuado sob o Processo n.º 1115-C/23, interposto contra uma decisão proferida pelo Tribunal Supremo em sede de providência de habeas corpus, no Processo n.º 02/23, cujo objecto era, precisamente, a arguição da inconstitucionalidade de tal decisão, por manutenção da situação carcerária do, ali, Recorrente, Pedro Lussati, fora dos termos e prazos legalmente fixados.  
O n.º 1 do artigo 497.º do CPC dispõe que a excepção de litispendência pressupõe a repetição de uma causa estando a anterior ainda em curso. 
Desta guisa, configurou-se, relativamente à questão da inconstitucionalidade da prisão preventiva do arguido Pedro Lussati, uma litispendência recursória entre o recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Processo n.º 1115-C/2023 e o recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Processo n.º 1126-B/2023. 
A tomada de decisão sobre qualquer petição submetida a juízo requer a verificação prévia da presença dos necessários pressupostos processuais, positivos ou negativos, que, nas leis do processo, se manifestam como excepções ou questões susceptíveis de obstar à decisão de mérito.  
De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 660.º do CPC deve o Tribunal começar por examinar e decidir as questões prévias que podem prejudicar ou obstar à apreciação do mérito. A litispendência e o caso julgado constituem excepções dilatórias que obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância. 
A excepção de litispendência é de conhecimento oficioso (artigo 495.º do CPC) e, obstando a que o tribunal conheça do mérito da causa proposta em segundo lugar (n.º 1 do artigo 499.º do CPC), determina a absolvição da instância (n.º 2 do artigo 493.º do CPC). Vide ALBERTO dos REIS, Código Civil Anotado, Vol. III, 3.ª ed., Coimbra Editora, 2012, pág. 43 e ss. 
Aplicando esta regra processual ao processo constitucional, ex vi do artigo 2.º do CPC, mesmo sendo a referida litispendência apenas parcial, ao Tribunal Constitucional seria legítimo, nos termos da lei, eximir-se de conhecer da matéria litispendente na causa sobrevinda, em favor do recurso primeiramente interposto, o qual, entretanto, veio a ser decidido pelo Acórdão n.º 932/2024, de 5 de Dezembro, desta Corte Constitucional.      
Quanto a este quesito, cumpre, ainda, assinalar que a questão da situação carcerária do arguido nada influi sobre a sua responsabilidade penal, declarada e confirmada por três instâncias da jurisdição comum, ainda que em termos diversos, uma vez que esta Corte Constitucional não encontrou, quanto às demais inconstitucionalidades invocadas pelo ora Reclamante, motivo bastante para as declarar. 
Estando exauridas as vias recursórias acerca da questão da responsabilidade penal e da pena concreta em que o arguido foi condenado, matérias do Acórdão em crise sobre as quais não incide a presente reclamação, transitará o processo para a fase de execução da pena, sendo o período de duração da prisão preventiva descontado no tempo de reclusão. 
Assim, em bom rigor, a partir do momento em que a questão da responsabilidade penal e da pena concreta aplicada não mais são susceptíveis de impugnação, a manutenção da situação carcerária precária não implica qualquer prejuízo para o arguido já condenado. 
Da argumentação expendida pode, então, concluir-se que, contrariamente ao invocado pelo ora Reclamante, não recaía sobre o Tribunal Constitucional uma obrigação de pronúncia, seja no que concerne à questão processual do excesso de prisão preventiva, seja no que diz respeito às inconstitucionalidades dela decorrentes. 
 
Sobre a nulidade por omissão de pronúncia face à invocada nulidade do Acórdão da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo por omissão de pronúncia, à prestação de declarações contra si mesmo e à afectação do património do arguido à esfera jurídica do Estado sem decisão transitada em julgado 
O Reclamante invoca, igualmente, a nulidade do Acórdão n.º 922/24 em pauta por omissão de pronúncia relativamente às inconstitucionalidades decorrentes do facto de o arguido e ora Reclamante ter sido obrigado a prestar declarações contra si mesmo e pela afectação do património do arguido à esfera jurídica do Estado, sem que se tivesse observado o trânsito em julgado de decisão condenatória. Invoca, igualmente, omissão de pronúncia desta Corte Constitucional relativamente à alegada nulidade do Acórdão da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo por omissão de pronúncia. 
Detenhamo-nos no teor do Aresto objecto de reclamação, no sentido de aquilatar se ao Reclamante assiste razão. 
Quanto à questão da alegada prestação de declarações contra si mesmo, em violação do princípio da proibição da autoincriminação e sem observância do direito à defesa, a págs. 44 do Acórdão em pauta (fls. 19635), diz-se: “Neste processo, a violação da garantia do nemo tenetur se ipsum accusare é arguida pelos Recorrentes Pedro Lussati (…) com fundamento no facto de terem sido obrigados a prestar declarações na fase de instrução sem a garantia do direito à defesa e de as declarações prestadas terem servido para fundamentar a acusação (…). Ora, da leitura dos autos, resulta um entendimento contrário ao dos Recorrentes. O Tribunal recorrido contraria, lapidarmente, o que alegam (fls. 18.620v), valoração reflectida nas diferentes peças processuais que demonstram que as declarações que sustentam a acusação foram prestadas depois da constituição como arguidos e tendo em atenção o direito de defesa dos Recorrentes, pese a reconhecida complexidade e dimensão do presente processo. Nesta medida, não se afigura linear a violação do princípio nemo tenetur se ipsum accusare, que encontra fundamento na dignidade da pessoa humana, conforma uma das garantias do direito ao julgamento justo e conforme, sendo ainda corolário do direito à presunção de inocência.” 
É, pois, evidente que esta Corte Constitucional não omitiu pronúncia relativamente a esta questão. 
No que diz respeito à questão da violação da propriedade privada e do direito a um julgamento justo e conforme, por motivo de afectação do património do arguido à esfera jurídica do Estado, atente-se no vertido a págs. 40 e ss. (fls. 19.631 e ss.): “(…) os Recorrentes, (…) embora alicerçados em distintas considerações de facto e de direito, vêm arguir a violação do direito ao julgamento justo e conforme. 
Para Pedro Lussati, a violação deste direito materializa-se no facto de, alegadamente, o Tribunal recorrido ter conhecido de questões incompatíveis com o disposto na Lei n.º 15/18, ter violado o seu direito à propriedade, com a venda dos seus bens que foram objecto de Arresto. Fundamenta, ainda, a violação com base em considerações relativas à insuficiência da matéria de facto provada e por não ter sido acautelado o seu direito à defesa na fase instrutória do processo. (…) Antes de tudo, é mister acentuar que as questões arroladas pelos Recorrentes (…) foram devidamente apreciadas por aquela Instância Superior da Jurisdição Comum. Foram sustentadas com fundamentos de facto e de direito apropriados, que não revelam, neste particular e prima facie, qualquer discordância entre o juízo decisório e os critérios normativos aplicados, quando em confronto com princípios e direitos fundamentais. Com efeito, a questão trazida à liça por Pedro Lussati relativamente à aplicação da Lei n.º 15/18 fica diluída no posicionamento que o Tribunal recorrido assumiu relativamente à constitucionalidade deste diploma legal e que se encontra espelhado em sede da questão prévia. O Tribunal recorrido pronunciou-se, ainda, no sentido de não existir prova sobre a alegada venda dos bens, o que, à partida, não conflitua com o direito de propriedade deste Recorrente.” 
Fica, portanto, cabalmente demonstrado que este Tribunal se pronunciou sobre esta questão. 
Já a alegada nulidade do Acórdão da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo por omissão de pronúncia não obteve tratamento por parte do Acórdão em crise devido à falta de pressupostos processuais para o efeito. 
A aludida omissão de pronúncia foi, efectivamente, alegada pelo ora Reclamante (vide fls. 19355 e ss.) no recurso interposto junto desta Corte Constitucional. No entanto, a nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia é uma invalidade passível de arguição em sede de recurso ordinário, sendo o mesmo cabível, ou de reclamação, no caso de se ter esgotado a cadeia recursória. Assim sendo, deveria o interessado ter arguido a nulidade do Acórdão supra-referido, ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, mediante a competente reclamação junto do Tribunal Supremo, nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 3.º do Código de Processo Penal Angolano (CPPA) e do n.º 3 do artigo 668.º do CPC, esgotando, assim, a jurisdição comum quanto a este quesito. 
Nos termos do disposto no § único do artigo 49.º da LPC, o esgotamento da jurisdição comum é pressuposto indispensável para a admissibilidade do recurso extraordinário de inconstitucionalidade.  
Destarte, não tendo sido esgotada a jurisdição comum, quanto à questão da nulidade do Acórdão da 1.º Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo por omissão de pronúncia, podendo tal decisão ser, ainda, reclamada em sede da mesma jurisdição, não poderia o Tribunal Constitucional pronunciar-se quanto à inconstitucionalidade da mesma por efeito da alegada violação do princípio da legalidade. 
Por todo o expendido, pode concluir-se que esta Corte Constitucional não incorreu em omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, ao prolatar o Acórdão n.º 922/24, de 06 de Novembro. 
Nestes termos, 
DECIDINDO 
Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em: NEGAR PROVIMENTO À PRESENTE RECLAMAÇÃO, TENDENTE À NULIDADE DO ACÓRDÃO N.º 922/24, DE 06 DE NOVEMBRO. 
Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional. 
Notifique. 
Tribunal Constitucional, em Luanda, 7 de Outubro  de 2025. 
OS JUÍZES CONSELHEIROS 
Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso (Presidente)  
Victória Manuel da Silva Izata (Vice-Presidente)  
Amélia Augusto Varela  
Carlos Alberto B. Burity da Silva (Relator)  
Carlos Manuel dos Santos Teixeira  
Emiliana Margareth Morais Nangacovie Quessongo  
Gilberto de Faria Magalhães 
João Carlos António Paulino (Declarou-se Impedido)  
Lucas Manuel João Quilundo  
Vitorino Domingos Hossi