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ACÓRDÃO N.º 1054/2025
PROCESSO N.º 1327-C/2025
Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade 
Em nome do povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional: 
I.  RELATÓRIO
Júlio César Tavares Dinis, com mais sinais de identificação nos autos, veio, por intermédio do seu mandatário judicial, nos termos da alínea a) do artigo 49.º, da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), com as alterações introduzidas pela Lei n.º 25/10, de 3 de Dezembro, interpor o presente recurso, contra o Acórdão proferido, aos 10 de Abril de 2025, pela 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 6334/24, que confirmou a Decisão do Tribunal a quo, condenando o Recorrente na pena de 7 (sete) anos de prisão, pela prática do crime de abuso sexual de menor de 14 anos, na forma continuada,  p.p. pelo n.º 2 do artigo 192.º do Código Penal, bem como de forma solidária, condenado ao pagamento de Kz. 100 000,00 (cem mil kwanzas) de taxa de justiça e Kz. 500 000,00 (quinhentos mil kwanzas) de indemnização à menor ofendida nos autos.
Não se conformando com a Decisão, interpôs, tempestivamente, recurso à esta Corte, onde, após notificação, nos termos do artigo 45.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), o Recorrente não se dignou em apresentar as suas alegações.
O processo foi à vista do Ministério Público, que promoveu nos seguintes termos:
“(…) Decorre dos autos que o Recorrente, inconformado com o douto Acórdão da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, vem aqui interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade (fls. 327 a 329).
Apreciado o pedido nesta Corte, o Recorrente foi convidado para, no prazo de 10 dias, aperfeiçoar a sua peça recursória, de modo a indicar os princípios, direitos, liberdades e/ou garantias constitucionais violados no Acórdão recorrido (vide fls. 345 e 348), mas, não o fez.
Na sequência, foi-lhe, novamente, concedido o prazo suplementar de 5 dias para conformar as alegações do recurso sob cominação de não conhecimento do recurso, porém, não reagiu (vide fls. 351 a 355).
Ora, considerando que a motivação do recurso se revela de extrema importância, na medida em que dela depende inteiramente a apreciação do recurso, impende sobre o Recorrente o ónus de elaborá-la com toda a ciência, sem descurar da lealdade processual, de apresentação de argumentos válidos e fundamentados que convençam o Tribunal Superior (n.º 1 do Artigo 690.º do CPC).
No caso, a peça recursória apresentada pelo Recorrente é ininteligível, considerando que não indicou os princípios, direitos e/ou garantias previstas na Constituição da República de Angola, supostamente, violados no Acórdão recorrido.
Assim, pese embora o recurso tenha sido admitido, é ponto assente que por não satisfazer o ónus da fundamentação recursória, tenha como implicação jurídica a deserção (n.º 2 do artigo 690.º do CPC).
Pelo exposto, promovo que seja o presente recurso julgado deserto, nos termos das disposições combinadas do n.º 2 do artigo 690.º e n.º 1 do artigo 292.º, ambos do CPC, aplicável subsidiariamente por força do artigo 2.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional”.
Foram prescindidos os vistos legais dos Juízes Conselheiros, nos termos do n.º 3 do artigo 707.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – LPC, cumprindo, agora, apreciar para decidir.  
II.  COMPETÊNCIA 
O Tribunal Constitucional é competente para conhecer e decidir o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade nos termos da alínea a) do § único do artigo 49.º e do artigo 53.º, ambos da LPC, bem como disposições conjugadas da alínea m) do artigo 16.º e do n.º 4 do artigo 21.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC), tendo sido esgotada a cadeia de recursos ordinários.
III.  LEGITIMIDADE
Nos termos da alínea a) do artigo 50.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, (LPC), têm legitimidade para interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional "(...) as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinário".
O Recorrente é parte no Processo n.º 6334/24 que tramitou na 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, e, não se conformando com a decisão proferida, tem legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade.
IV.  OBJECTO
O presente recurso tem como objecto o Acórdão proferido pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 6334/24, que confirmou a Decisão do Tribunal recorrido.
V.  APRECIANDO  
O presente recurso resulta do facto de o Recorrente estar inconformado com o Acórdão proferido a 10 de Abril de 2025, pela 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 6334/24, que confirmou a Decisão do tribunal a quo, condenando-o na pena de 7 (sete) anos de prisão, pela prática do crime de abuso sexual de menor de 14 anos, na forma continuada, previsto e punido pelo n.º 2 do artigo 192.º do Código Penal, bem como de forma solidária, condenado ao pagamento de Kz. 100 000,00 (cem mil kwanzas) de taxa de justiça e Kz. 500 000,00 (quinhentos mil kwanzas) de indemnização à menor ofendida nos autos.
Admitido o recurso, o Recorrente foi notificado para apresentar as suas alegações no prazo de 10 dias (fls. 348), nos termos do artigo 45.º da LPC.
Precludido o prazo, o mesmo não apresentou as alegações de recurso, conforme informação da Secretaria Judicial, à fls. 349.
Deste modo, em obediência aos princípios da tutela jurisdicional efectiva, da ampla defesa e do direito ao recurso, foi, suplementarmente, concedido ao Recorrente um prazo de 5 dias para conformar as alegações do recurso sob cominação de não conhecimento do mesmo e, deste modo, ser julgado deserto (vide fls. 351 a 354).
De realçar que, por determinação legal, “o Recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual concluirá, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede alteração ou anulação da decisão (cfr. n.º 1 do artigo 690.º do CPC)” que se aplica subsidiariamente ao Processo Constitucional, ex vi do artigo 2.º da LPC.
Como sustenta Marco Carvalho Gonçalves, “a alegação de qualquer recurso deverá incidir sobre o seu ataque argumentativo sobre os pontos concretos da fundamentação da decisão recorrida que, no entender do recorrente, sejam criticáveis, sob pena de se considerar que esta não foi objecto de uma verdadeira e própria oposição (Dicionário Jurisprudencial de Processo Civil, Vol. I, Coimbra, 2012, p. 190)”.
Existe jurisprudência firmada por este Tribunal Constitucional com indicação de que, nos casos em que for possível o sentido, o alcance e a vontade do Recorrente que requer, mas não alega, nestes casos devem ser aproveitados os elementos substâncias do requerimento de interposição de recurso em homenagem aos princípios da adequação funcional e da autonomia do processo constitucional. A propósito, vejam-se, entre outros, os Acórdãos n.ºs 355/2015, 588/2015, 364/2015 e 783/2022 proferidos por esta Corte e disponíveis em www.tribunalconstitucional.ao.
No entanto, fazendo uma leitura cuidada do seu requerimento de interposição de recurso constante de fls. 327 a 329, constata-se que o mesmo não traz qualquer fundamento que dele se possa extrair as suas pretensões e abranger a apreciação do presente recurso; ou seja, não se discriminam com facilidade e de forma a arguir as questões invocadas.
Ademais, importa salientar que o Recorrente, quando apresenta as suas alegações, deve terminar com conclusões sintéticas onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida, devendo tais conclusões serem idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que pretende suscitar na impugnação que deduz e que o tribunal superior cumpre solucionar.
No caso em apreço, o Recorrente, apesar de ter sido formalmente notificado, por intermédio dos seus mandatários judiciais para que pudesse apresentar as suas alegações de recurso, não deduziu a complexidade nem a inteligibilidade das mesmas, ou seja, não as apresentou, ignorando totalmente os prazos concedidos.
Porque o Recorrente não cumpriu o ónus que lhe é imposto pelo n.º 1, do artigo 690.º do CPC, o douto Acórdão recorrido não merece ser apreciado, ou seja, esta Corte não deve apreciar o presente recurso, por falta de alegações e por não ser possível retirar pretensão e a questão constitucional, julgando-o deserto nos termos das disposições combinadas do n.º 5 do artigo 41.º da LPC e do n.º 1 do artigo 292.º do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo constitucional ex vi do artigo 2.º da LPC. 
Nestes termos,
DECIDINDO
Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em: JULGAR DESERTO O PRESENTE RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE INCONSTUCIONALIDADE E, EM CONSEQUÊNCIA, CONSIDERAR EXTINTA A INSTÂNCIA, NOS TERMOS DA ALÍNEA C) DO ARTIGO 287.º DO CPC.
Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional.
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, 4 de Dezembro de 2025.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Laurinda Jacinto Prazeres (Presidente) 
Victória Manuel da Silva Izata (Vice-Presidente) 
Amélia Augusto Varela
Carlos Alberto B. Burity da Silva
Carlos Manuel dos Santos Teixeira
Gilberto de Faria Magalhães
João Carlos António Paulino
Maria de Fátima de Lima D`A. B. da Silva
Vitorino Domingos Hossi (Relator)